A carreira de escritor no Brasil Ă© permeada por desafios significativos. Extremamente difĂcil sobreviver escrevendo livros, o que faz da literatura uma atividade marginal. Quem gosta de se expressar por escrito tem que espremer essa atividade entre outras responsabilidades mais urgentes.
O mercado editorial
Se, nos afazeres cotidianos, o espaço da literatura fica em segundo plano para quem escreve, ela tambĂ©m enfrenta dificuldades do lado dos leitores. Segundo dados do Sindicato Nacional dos Editores de Livros - SNEL - e da Nielsen BookScan, a venda mĂ©dia de livros no Brasil gira em torno de 2,5 a 3 livros por habitante ao ano, baixa em relaĂ§Ă£o a outras nações ricas, onde a mĂ©dia gira em cerca de 10.
O tempo de lazer para leitura serve como indicador da segregaĂ§Ă£o sĂ³cio-cultural do paĂs. Em 2007, uma pesquisa do MinistĂ©rio da Cultura apontou que apenas 21% dos entrevistados haviam comprado pelo menos um livro no ano.
O baixo nĂºmero resultava da disparidade de renda. Entre quem tinha renda familiar de atĂ© um salĂ¡rio mĂnimo, 71% nĂ£o compravam livros - fĂ¡cil imaginar as dificuldades diĂ¡rias dessas pessoas em sobreviver, o que fragiliza o tempo dedicado Ă leitura.
AlĂ©m do tamanho, o mercado editorial apresenta outras limitações, como a pirataria, a concorrĂªncia com obras estrangeiras e o preço elevado dos livros. Como em tudo mais, o paĂs mantĂ©m o potencial do mercado editorial reprimido.
Um caminho sem renda
A internet estĂ¡ repleta de cantos de sereia de como ganhar dinheiro. Uma das formas sugeridas seria atravĂ©s dos direitos autoras da venda de livros escritos por uma pessoa. Nada mais longe da realidade.
Em paĂses com um mercado editorial maior, sem as restrições brasileiras, constitui um fato raro sobreviver exclusivamente de literatura. É comum que escritores busquem uma renda mais estĂ¡vel em outros tipos de trabalho.
A situaĂ§Ă£o se torna bem mais difĂcil no Brasil. Um bom exemplo do panorama nacional se encontra em artigo de 2002 do jornal Folha de SĂ£o Paulo. Uma rĂ¡pida conversa com escritores e escritoras brasileiros consagrados alertava os amantes das letras: ganhar dinheiro com literatura Ă© mais difĂcil que ganhar na loteria.
Medalhões da literatura nacional dependiam de outras fontes de renda para sobreviver. Entre eles, Lygia Fagundes Telles, Hilda Hilst, IgnĂ¡cio de Loyola BrandĂ£o, Lya Luft e Moacyr Scliar. Este Ăºltimo chamava a atenĂ§Ă£o para uma das caracterĂsticas da literatura, de que o sucesso comercial nem sempre reflete a qualidade de uma obra. Muitas vezes, um autor demora gerações para ser reconhecido.
Levantamento de 2019 do cientista social Marcello Stella, ao longo de seu mestrado na USP, confirmou a situaĂ§Ă£o dos escritores nacionais. Investigando informações sobre 354 autores, Marcello identificou que apenas 5% trabalhavam exclusivamente como escritor. O restante trabalhava ou possuĂa outras fontes de renda.
Nas horas vagas
A literatura, portanto, Ă© algo a se praticar nas horas vagas. E dependerĂ¡ de certa estabilidade socioeconĂ´mica - tanto para quem escreve quanto para quem lĂª.
Para aqueles investidos na intenĂ§Ă£o de escrever, nĂ£o deve ter importĂ¢ncia que o retorno serĂ¡ de 8% a 10% do preço de capa. Sucesso literĂ¡rio nĂ£o corresponde a sucesso comercial e, geralmente, os dois nĂ£o andam juntos.
A perseverança se faz uma ferramenta imprescindĂvel para a carreira de escritor. Perseverar no enfrentamento de toda dificuldade, na criaĂ§Ă£o de momentos, por mais breve que sejam, de escrever. Perseverar na criaĂ§Ă£o de uma obra, a partir do qual alguĂ©m possa se apresentar ao mundo enquanto um escritor.
E nessa trajetĂ³ria conta-se, nos dias atuais, com o apoio da tecnologia. Plataformas de auto-publicaĂ§Ă£o facilitam a transformaĂ§Ă£o de textos em livros. A rede mundial de computadores permite a abertura de canais de expressĂ£o em mĂºltiplas formas - escritas e audiovisuais.
Se fosse possĂvel dar um conselho, seria algo assim: nĂ£o desista. A literatura pode ser uma carreira, mas uma que nĂ£o se encaixa direito nos mecanismos da comercializaĂ§Ă£o.
Agitador Cultural
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